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OLÁ,

A palavra mágica de Letrux

Atriz, cantora e escritora, fala sobre carreira, a paixão pela palavra e a busca pelo equilíbrio fora dos palcos

Por Humberto Maruchel
Atualizado em 14 fev 2023, 15h47 - Publicado em 13 fev 2023, 10h51
Foto de Letrux.
 (Felipe Ávila/arquivo)
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Letrux tem algo de muito especial. Certamente, a vocação musical é uma qualidade inegável, mas há outro componente dessa cantora que não é tão fácil nomear. Talvez algo místico, uma peculiaridade que carrega consigo, em seu jeito performático. Sabe aquelas situações em que você sente que reconhece uma pessoa sem nunca tê-la conhecido antes? É mais ou menos esse o efeito que a música dela produz.

É possível encontrar paralelos de seu trabalho com as trajetórias de Patti Smith ou de Joni Mitchell. Elas escrevem com assiduidade, têm uma forte ligação com a literatura e com a poesia e produzem músicas que, de início, podem parecer estranhas, mas em poucos instantes é como se conhecêssemos a vida toda. Além disso, é possível dançar ao som de suas vozes, mesmo quando recitam um poema. Quem sabe não seja essa a característica que estava buscando?

Foto de Letrux.
(Felipe Ávila/arquivo)

Durante a conversa, ela navegou pela sua infância, pela carreira, mas vez ou outra a entrevista parecia retornar para o mesmo assunto: a busca pelo equilíbrio. Existe um lado muito racional, e outro extremamente intuitivo, que guiam seu trabalho e sua vida. Suas músicas evocam uma sensação de transe. Enquanto todos estão voando em seus shows, soltos em devaneios, Letrux mantém os pés fincados no chão. “A terra me chama o tempo inteiro de volta. E eu consigo desconectar, ter delírios, mas eu sempre gosto de voltar para terra.” Isso diz respeito, inclusive, à sua relação com as drogas. “Eu não gosto tanto de perder totalmente o controle. Tem gente que adora. Eu prefiro ficar na terra, que é a minha casa.”

Ela faz, inclusive, saltarmos de assunto a outro.

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O início da estrada

Letrux cresceu como Letícia Pinheiro de Novaes. Carioca da gema, capricorniana, foi educada num lar que em que não havia nenhum artista. Havia apreciadores de música, de artes plásticas, mas ninguém que vivesse da arte. Talvez esse vácuo tenha causado alguma perplexidade na pequena Letrux, pois decidiu ela própria tornar-se uma multiartista. Além de cantora, é compositora, atriz e escritora. Já publicou dois livros, Zaralha – Abri A Minha Pasta e Tudo Que Já Nadei, foi colunista do jornal O Globo e da revista digital Gama, fez cinema e estrelou uma série pelo Star+, Dois Tempos, de Vera Egito. E está em vias de estrear outra pela Globoplay, sob direção de Leandra Leal.

Fotos de Letrux.
(Felipe Ávila/arquivo)

Como tantas outras crianças curiosas pelo universo artístico, Letícia se via como um peixe fora d’água. Era a garota alta, vista como meio esquisita, mas que não tinha medo ou vergonha de se expressar. Isso, naturalmente, causava incômodo nos demais. Ainda jovem, entrou para o grupo de teatro da escola e ali encontrou sua turma. “São pessoas que são minhas melhores amigas até hoje.”

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“A terra me chama o tempo inteiro de volta. E eu consigo desconectar, ter delírios, mas eu sempre gosto de voltar para terra”

Letrux

Começou na estrada como atriz. A música veio mais tarde. Era os primórdios da internet, e foi com ela que aprendeu a tocar violão. Com a experiência adquirida nos palcos, construiu as próprias composições. Encontrou inspiração em seus antigos diários. “Conforme aprendi oito acordes, me dei por satisfeita, peguei meus diários e fui buscar as loucuras que tinha na cabeça.”

Manteve o hábito como parte de seu processo criativo. Algo que cultiva até hoje. Suas letras refletem os momentos de intimidade do passado e do presente. É, afinal, a palavra que dá a partida no seu trabalho. Não é raro as letras já virem acompanhadas da melodia em sua mente. “A palavra é a minha paixão, então se tem palavra no roteiro, se tem palavra no livro, se tem palavra na música eu me curvo à palavra. Acho que eu nunca vou conseguir ser só cantora.”

Foto de Letrux.
(Felipe Ávila/arquivo)
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Após a formatura, enquanto seus antigos colegas teatro faziam cadastro na TV Globo, Letrux escolheu formar uma banda, a Letuce. Isso aconteceu após conhecer o músico Lucas Vasconcellos, em 2007. Um encontro que se desdobrou em uma parceria profissional e amorosa. “Conforme eu conheço o Lucas, acho que eu assento e me dou conta de que não conseguiria fugir daquele destino, de ser uma artista.”

Ser quem se é

Com 20 e poucos anos, os valores eram mais ou menos iguais aos que tem hoje. Já pensava no feminismo e trazia ele em suas canções, mas os tempos eram outros. Letícia e Lucas produziram três álbuns e conquistaram seu público, entre aqueles que apreciavam MPB, mas também buscavam um som mais alternativo. “Sinto que foi com Letuce que eu me profissionalizei. Foi um sucesso local, não foi uma coisa nacional. Só quando realmente eu lanço minha carreira solo, como Letrux, que a coisa toma uma proporção maior.” A música incorporava elementos de outras linguagens. Havia a performance teatral, a palavra-poema de suas letras, e a peça musical para dialogar com o público.

Foto de Letrux.
(Felipe Ávila/arquivo)

Em 2017, lança seu álbum solo, Letrux em Noite de Climão. Depois dele, vieram outros três: Letrux em Noite de Pistinha, Letrux em Noite de Climão – Ao Vivo e Letrux aos Prantos. Traz um pouco do pop, do indie eletrônico, sempre com batidas suaves e um forte ênfase nas letras.

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Letrux faz questão de lembrar que faz parte de uma geração de mulheres compositoras, como Duda Beat, Luedji Luna e Liniker. Se antes, o cenário da música brasileira era conhecido por ter grandes intérpretes, hoje muitas defendem ter a escolha do que irão cantar. Mas, claro, tudo vem com seu preço. Isso significa, muitas vezes, resistir enquanto uma artista independente. Como no caso de Letrux.

Perto do fim da conversa, mais uma vez: o equilíbrio. Não foi uma busca fácil, ela conta. Foi bem custosa, aliás. Quando completou 35 anos, as coisas pareceram se encaixar enfim. No réveillon de 2016 para 2017, saltou nos antigos diários e se deparou com uma melancolia que se fazia sempre presente. Aquilo a deixou assustada e foi seu ponto de virada. Hoje, a sensação que passa é de estar perfeitamente satisfeita em ser quem é.

“Tem uma frase de David Bowie que eu acho linda. Diz assim: ‘É tão bom se tornar quem você é’. Quando eu li essa frase, eu pensei ‘nossa, eu demorei tantos anos para me tornar quem eu sou’. Tinha vergonha, tinha trauma, tinha medo. E agora estou vendo que a vida está passando muito rápido, e eu fico ‘meu Deus, se eu não me tornar quem eu sou agora, quando?’”

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