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OLÁ,

100 livros essenciais: Memórias de um Sargento de Milícias

Livro singular do romantismo, crônica de costumes de Manuel Antônio de Almeida tem como protagonista o primeiro grande malandro da novelística brasileira

Por Redação Bravo!
23 jun 2024, 09h00
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Polícia do Rio de Janeiro, em aquarela de Thomas Ender (1817-1818) (Thomas Ender/domínio público)
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A marca que Manuel Antônio de Almeida (1831- 1861) deixaria na literatura brasileira se deve a um romance singular. Publicado entre 1852 e 1853 como folhetim do Correio Mercantil e em livro de dois volumes nos anos de 1854 e 1855 (assinado por “Um Brasileiro”), Memórias de um Sargento de Milícias parece situar-se mais temporal do que estruturalmente no romantismo. Nascido no Rio de Janeiro e falecido em um naufrágio, esse médico de formação, sem pretensões literárias, deve ter encontrado na falta de compromisso com as letras a espontaneidade que marcou esta obra. Além disso, biógrafos de Almeida e análises sociológicas do seu romance sugerem que a infância pobre expôs-lhe um universo que a literatura poderia explorar com mais precisão.

Passada em sua cidade natal, na época de d. João 6º, a história se concentra em Leonardo, o “filho de uma pisadela e de um beliscão” entre Leonardo Pataca (“algibebe em Lisboa”) e Maria da Hortaliça (“rechonchuda e bonitona”), enjeitado e criado por uma parteira e um bar beiro. Segundo o crítico Antonio Candido, Leonardo é “o primeiro grande malandro que entra na novelística brasileira, vindo de uma tradição folclórica e correspondendo, mais do que se costuma dizer, a certa atmosfera cômica e popularesca de seu tempo”.

O coloquialismo, o humor, os tipos humanos que Almeida recria do “tempo do rei”, os costumes, as festas (folias, procissões, batizados), as peripécias do protagonista para livrar-se das punições de seu superior, o Major Vidigal, o compromisso dele com Luisinha e o caso com outra mulher, Vidinha, tudo se apresenta de modo dinâmico e ágil.

Suas descrições são preciosas: “Chegou o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira; sobre o padrinho houve suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse o Sr. juiz; porém teve de ceder a instâncias da Maria e da comadre, que queriam que fosse o barbeiro de defronte, que afinal foi adotado. Já se sabe que houve nesse dia função: os convidados do dono da casa, que eram todos dalém mar, cantavam ao desafio, segundo seus costumes; os convidados da comadre, que eram todos da terra, dançavam o fado. […] Depois do minuete foi desaparecendo a cerimônia, e a brincadeira aferventou, como se dizia naquele tempo. […] Tudo daí em diante foi burburinho, que depressa passou à gritaria, e ainda mais depressa à algazarra […]”.

Obra comumente aproximada por estudiosos ao realismo-naturalismo, Memórias de um Sargento de Milícias tem, de fato, elementos coincidentes com a escola literária que anos mais tarde se firmaria no Brasil. O retrato das condições de vida de camadas mais pobres — apesar de transfiguradas pelo que há de cômico nas descrições — já difere em muito dos meios sociais que escritores como José de Alencar e Joaquim Manuel de Macedo retratam em seus romances. Almeida estaria, de certa forma, mais próximo de Aluísio Azevedo. Esta crônica de costumes do Rio da época colonial tornou-se uma daquelas obras que se descolam de modelos vigentes para tornar-se antecipadoras ou mesmo referências para outras vindouras.

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Este texto faz parte do Especial da Bravo! “100 livros essenciais da literatura brasileira”, publicado originalmente em 2009

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