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Vladimir Brichta vive seu primeiro grande vilão na TV

O ator irá interpretar o coronel Egídio em Renascer, que retorna para assumir as terras do pai e se vingar do protagonista, José Inocêncio

Por Humberto Maruchel
Atualizado em 23 fev 2024, 10h20 - Publicado em 20 fev 2024, 09h00
Egídio (Vladimir Brichta) com Joana (Alice Carvalho)
Egídio (Vladimir Brichta) com Joana (Alice Carvalho) (Globo / Paulo Belote/divulgação)
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Seja na TV, no cinema ou no teatro, a carreira de Vladimir Brichta é marcada por personagens de comédia, papéis dramáticos e até alguns mocinhos na televisão. Com cara de bom moço, o ator quase não teve oportunidades de interpretar um antagonista em uma novela. Isso aconteceu apenas uma vez, em “Segundo Sol” (2018), novela de João Emanuel Carneiro. Embora seu personagem não fosse exatamente um grande vilão. Finalmente, neste ano, Vladimir interpretará um sujeito mau-caráter, daqueles que dão nojo. Na próxima quarta-feira (21), o ator integrará o elenco da novela “Renascer”, de Bruno Luperi, no papel de Egídio (papel que foi de Herson Capri na versão de 1993).

Filho do Coronel Firmino (Enrique Diaz), assassinado na primeira fase da novela, Egídio retornará para administrar as terras do pai e se tornará o grande vilão da segunda fase, um dos inimigos de José Inocêncio (Marcos Palmeira). Egídio acredita que foi Inocêncio o responsável pela morte de seu pai e buscará vingança, porém suas maldades vão muito além. “Ele terá as cenas mais cruéis da novela”, comenta o ator em entrevista para Bravo!. Ele fará dupla com a atriz Camila Morgado, que interpreta Iolanda, a esposa de Egídio. “Discutimos que tipo de tom gostaríamos de dar para esse casal, que vive uma relação abusiva. É um homem tóxico, que assedia moral e sexualmente a mulher e as funcionárias”, explica.

Assim como o pai de seu personagem, ele será um intermediador de compra e venda de cacau. O universo cacaueiro, aliás, é bastante familiar ao ator, que nasceu em Diamantina (MG), mas cresceu em Itacaré (BA), cidade próxima de Ilhéus (BA), local em que se passa a novela. Não foi surpresa, portanto, quando veio o convite para a novela.

Para poder voltar para o horário nobre da TV Globo, Vladimir precisou abrir mão do posto de apresentador do Papo de Segunda, programa de variedades do GNT, que comandava ao lado de João Vicente de Castro, Francisco Bosco e KondZilla. “Quando surgiu o convite, fiquei muito feliz, achava que eu poderia contribuir de alguma forma e quis me pôr à prova. Sabia que não poderia durar mais do que o final do ano porque teria a novela e não pretendia fazer nada junto com Renascer. Nosso trabalho envolve muita concentração, e estamos num momento que tudo está tão dispersivo que quis trabalhar de uma forma mais centrada na atuação”, ponderou.

O intérprete conta que cada vez mais tem buscado se concentrar em menos trabalhos, algo que vai na contramão da dinâmica hiperconectada contemporânea. Para o ator, isso envolve também abdicar de um perfil nas redes sociais. Vladimir falou sobre o novo personagem, sobre os bastidores da atuação, personagens de sucesso como Armane, em Tapas e Beijos (2011-2015) e relembrou momentos do início de sua carreira, como quando fez a peça “A Máquina”, ao lado de Gustavo Falcão, Lázaro Ramos e Wagner Moura. Leia a entrevista completa a seguir:

Para atuar na nova novela, você abriu mão do posto fixo no programa Papo de Segunda, no GNT. Como foi participar do programa durante esse tempo? O que ficou de aprendizado e de saudade dessa jornada por lá?

Sempre assisti e gostei muito do programa. Já tinha participado na primeira formação e adorei o papo. No início do ano, fiz outra participação. E quando surgiu a oportunidade de participar, confesso que já tinha passado pela minha cabeça a pergunta: “Como seria se eu participasse daquela conversa?”. Quando surgiu o convite, fiquei muito feliz, achava que poderia contribuir de alguma forma e quis me pôr à prova. Sabia que não poderia durar mais do que o final do ano porque eu teria a novela e não pretendia fazer nada junto com “Renascer”. Estou cada vez mais focado em uma coisa só por uma escolha. Já dei conta de fazer muitas coisas ao mesmo tempo no passado, mas comecei a querer fazer escolhas. Nosso trabalho envolve muita concentração, e estamos num momento que tudo está tão dispersivo que quis trabalhar de uma forma mais centrada na atuação. Aceitei o convite certo de que eu não poderia continuar, mas fui muito feliz, realizado e me senti desafiado.

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Você comentou sobre estar focado em uma coisa só e me ocorreu que você não tem redes sociais. Essa escolha tem a ver com esse objetivo?

Tem gente que vem e me diz que conversou comigo por Instagram, mas não tenho. A minha curiosidade não é maior do que o meu desejo de entrar [nas redes]. Não é por questão de privacidade, há muito tempo sou uma pessoa pública, e já deixo isso de lado. Antes de começar a minha carreira na televisão, em 2001, sabia que se eu entrasse numa novela que uma parte da minha vida privada seria perdida. Já estou acostumado a isso, sabia que fazia parte do pacote. Hoje em dia, parece que é indispensável ter redes sociais, mas eu optei por não ter.

No início da sua carreira, alguém te aconselhou sobre como seria se tornar uma pessoa pública?

Muitos professores e diretores me deram apoio. Troquei muitas informações com os meus amigos, principalmente com o Wagner (Moura) e o Lazinho (Lázaro Ramos). A fama veio para nós, mais ou menos, na mesma época. E nós trocávamos impressões. Cheguei a ter crises sobre isso, quando estava em 2002, fazendo uma peça do João Falcão. Estava fazendo novela ao mesmo tempo. E teve um momento que saí rolando no palco e quando levantei, escutei algumas vozes “É ele”. Me ocorreu que as pessoas estavam vendo um ator famoso, não um personagem. E fiquei na dúvida se deveria continuar fazendo teatro. Mas logo em seguida percebi que o teatro é o meu lugar e que o importante é separar a pessoa pública do trabalho artístico.

Sua carreira é marcada por personagens cômicos, como Bingo, nos cinemas, e Armane, na série Entre Tapas e Beijos. Como é interpretar um coronel vilão no horário nobre da TV neste momento da sua carreira?

Já fiz um vilão em 2018, que era o irmão do protagonista em “Segundo Sol”. Tinha uma vilania, mas não ocupava o arquétipo do vilão de novela. Achava que em algum momento teria essa oportunidade. E em televisão, fiquei muito marcado pelo humor, desde a primeira novela, “Porto dos Milagres” (2001). Parte da minha formação televisiva foi assistindo não só novelas. Eu gravava tudo, “Comédia da Vida Privada”. Comecei a fazer novelas, pintou algumas coisas de humor, até que enveredei a fazer séries de humor. E estava num lugar que eu gostava, que gostava de assistir e curtia participar. Mas, de alguma forma, faltava essa figura. Sei quanto é novo para o público que me acompanha na televisão essa escalação, e isso me deixa muito feliz. É muito importante trazer esse frescor. Mas esse personagem traz algumas situações bastante cômicas. Ele tem as cenas mais cruéis da novela, mas também algumas das mais cômicas. Tem sido bastante animador, enquanto ator.

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Egídio (Vladimir Brichta) (Globo / Paulo Belote/divulgação)

Como costuma ser a preparação antes de uma novela da Globo? Quais elementos são fundamentais para te dar estofo na hora das gravações? Essa novela teve alguma preparação especial / diferente ou inovadora para você?

Conheço muito desse universo do cacau. Cresci entre Salvador e Itacaré, uma cidade colada em Ilhéus, que produziu muito cacau. Meu personagem vivia, justamente, entre essas cidades. De alguma forma, essa experiência pendular dá o sotaque para esse personagem. Mas já tem mais de 20 anos que moro no Rio. Obviamente, que o sotaque se perde um pouco. Resgatei um pouco esse sotaque juvenil, o vocabulário, a musicalidade. Mas conheço bastante deste universo. No começo, tive muita vontade de ler Jorge Amado, especialmente as obras que falam do cacau. Comecei pelo penúltimo livro dele a respeito do tema, “Tocaia Grande: a Face Obscura”. Depois voltei nos primeiros: “Cacau”, “Terras do Sem-Fim”, “São Jorge dos Ilhéus”, e descobri inúmeros elementos da obra mítica, fantástica do Benedito (Ruy Barbosa). Foi uma experiência muito gostosa, de se permitir crer no mítico, porque a novela é carregada desses elementos. A novela flerta com esse imaginário.

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Além disso, tem outro elemento, conheço bem esse personagem, mas não me identifico com ele. É um fazendeiro que explora mão de obra de forma análoga à escravidão. Ele dá um pedaço de terra para o funcionário e obriga trabalhar e gastar tudo ali. Ele não divide os lucros. Essa coisa que foi inventada em 14 de maio de 1888. Ainda hoje, as pessoas exploram dessa forma. Vemos a quantidade de pessoas recuperadas de uma vida escravizada. Jorge Amado falava disso nos anos 1930 e 40. Esse personagem traz isso. Acho fundamental que a obra trate desse tema, e de forma que não seja panfletária. Tive alguns encontros com Jefferson Miranda, com a Moyra, e com Camila Morgado, que interpreta a minha esposa. Discutimos que tipo de tom gostaríamos de dar para esse casal, que vive uma relação abusiva. É um homem tóxico, que assedia moral e sexualmente a mulher e as funcionárias. Não queríamos ser levianos, nem fazer um drama que as pessoas suportariam em 1h30 no cinema, mas não aguentariam por 190 capítulos.

Esse personagem traz algumas situações bastante cômicas. Ele tem as cenas mais cruéis da novela, mas também algumas das mais cômicas. Tem sido bastante animador, enquanto ator.

De que maneira a novela pode contribuir para avançar nesses debates, como assédio e escravidão contemporânea?

As novelas não têm o hábito de inventar temas, diferente do cinema. Faz parte da novela pegar as temáticas que estão aí, muito da esfera emocional, valores contemporâneos e ela reverbera isso. Claro que a novela é entretenimento, mas às vezes ela consegue ir além, consegue romper essa barreira. Quando isso acontece, claro que é um trunfo a mais. Como atores, entendemos o ser político que o ator pode ser e o debate sobre determinados temas podem beneficiar a sociedade. O Benedito é, de certa forma, um cara comprometido com questões sociais. Botar isso em pauta, sem ser panfletário e chato, é muito importante. Esse compromisso que a novela tem com a realidade vai até determinado capítulo, mas não tem um compromisso absoluto, senão fazemos um documentário. A ficção tem esse propósito de falar não o que é, mas o que gostaria de ser.

Desde Pantanal, temos visto que o remake de clássicos parece ser um formato que funciona muito bem. Renascer está indo super bem na crítica e também na audiência. O que, para você, explica esse interesse repentino em novelas do passado?

Começa que são do mesmo autor, do Benedito. Tem alguma coisa na qualidade da escrita dele, e obviamente do Bruno Luperi. Talvez, inclusive, essas questões. Na novela de 1993 tinha a personagem Buba, que era intersexual. Desta vez, é uma atriz trans que a interpreta. Ela dá protagonismo, de certa maneira, ao universo LGBTQIAP+. Se você fala do cacau, você acaba tratando do agronegócio, ela aborda a reforma agrária. A questão do meio ambiente é a pauta mais urgente e ele já falava nisso em suas obras. Além disso, sem demérito de outras novelas que não alcançam o mesmo engajamento, é uma obra muito bem feita. São novelas menos apressadas e urgentes, elas vão na contramão do que vemos em dramaturgia, construção de novelas e séries. É uma novela que tem três páginas de cena, elas mudam a dinâmica de quem assiste. Por causa disso, poderia causar uma rejeição tremenda, mas por algum motivo as pessoas se interessam e desaceleram. Muitas assistem com o celular na mão e tuítam ao mesmo tempo, faz parte.

E como tem sido contracenar com Marcos Palmeira? Vocês possuem alguma dinâmica ou ritual durante as gravações?

A primeira novela que fiz (Porto dos Milagres) foi com o Marquinho, como nós o chamamos. Passados 23 anos, estamos trabalhando juntos pela segunda vez. Gravei pouco com ele, e as cenas dos dois são sempre de embates, num clima meio de faroeste, o que é muito gostoso de atuar. Envolve muita ironia, muito sarcasmo. Já gravei bastante com a Camila Morgado, com o Irandhir Santos, ele faz o Tião Galinha, ao lado de Alice Carvalho, que faz a Joaninha. Tem climas muito diferentes com cada um deles, o que é muito legal porque acabamos transitando como na realidade, com temperaturas diferentes; na escola, no trabalho, em casa.
O que tem em comum é que todos estão muito apaixonados e envolvidos no que estão fazendo. Todos chegam com o texto decorado, todos estão muito empenhados. A primeira fase foi muito especial, com grandes atuações, com muito alto nível. O sarrafo já estava alto.

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Enquanto você dá os primeiros passos na vilania, a Adriana Esteves já fez muitas vilãs. Você costuma dividir seu processo criativo com ela? Se sim, como funciona essa dinâmica? (Vladimir e Adriana são casados)

Ajudar, com certeza. O fato de ela fazer e fazer tão bem o trabalho dela, claro que ajuda. E como dividimos nossas experiências em casa, acaba que pelo convívio nós nos ajudamos e nos referenciamos. No começo de novela, ela me ajuda a decorar texto, mas é muito pouco. E ela sempre tem alguma coisa a dizer, mas não é uma interferência muito suntuosa porque o trabalho de criação é algo muito particular. Nós falamos da vilania na vida, como pessoas dominam normalmente a narrativa porque faz parte da manipulação. Falamos de questões gerais, menos específicas sobre coisas do texto.

Atuar é sempre se apropriar e para fazer isso precisamos trazer para o nosso jeito. Ator tem que tomar certo cuidado para não querer que o outro ator faça do jeito que ele faria.

No último ano, tivemos um novo projeto de governo em curso e a retomada do Ministério da Cultura. Como você avalia o retorno do Ministério da Cultura para o fomento da classe artística?

É um respiro gigantesco. Havia deliberadamente um projeto de sufocamento de toda manifestação artística. A volta do Ministério é algo fabuloso, tanto simbolicamente, com a mensagem que passa para a sociedade, quanto na sua gestão de pleitear mais recursos e pensar a cultura de forma mais democrática.

Agora, claro, há pautas que continuam urgentes, como a questão da cota de telas e a defesa da produção nacional, algo que pode parecer intervencionismo, mas é praticado também pelos EUA e França. Acredito que o Ministério tem trabalhado por essas questões. Voltamos da barbárie, das trevas.

Vladimir-Brichta
(Avianca/divulgação)
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Recentemente, você gravou a novela “Pedaços de Mim”, que será exibida pela Netflix. Como foi fazer uma novela para streaming? O que pode nos adiantar desse projeto?

Ainda não posso adiantar muito, porque as plataformas, ao contrário das novelas que adoram dar spoilers, seguram as informações com muita cautela. Foi uma experiência ótima. Estava com Maurício Faria, que é um parceiro de longa data, é alguém em quem confio muito, e me senti muito à vontade na condução. Ele também vinha de uma novela muito delicada, então foi ótimo encontrá-lo com essa mesma pegada. É uma série bastante novelesca, no melhor dos sentidos, mas cheia de ganchos que vemos nas plataformas de streaming, com séries com menos capítulos, que investem muito na surpresa. É um melodrama com teor de dramaticidade e surpresas muito grandes.

Quanto você se baseou na representação de Herson Capri? Ele te deu alguma dica para o papel? Assistiu a algum episódio da novela antiga para compor sua caracterização?

A primeira coisa que fiz foi contar para a Adriana, e a segunda foi mandar mensagem para o Herson. Disse que estava honrado de fazer um personagem que ele tinha feito. Ele é queridíssimo, super elegante e disse que eu faria super bem. Tive a bênção dele. Mas na época, eu não vi. A novela foi muito importante na minha carreira, apesar de eu não ter assistido a muitas novelas. Mas foi muito marcante porque a novela se passava em Ilhéus. Teve produção de elenco, testes lá. Para nós, essas pessoas de Salvador que estavam fazendo a novela eram heróis, pessoas que nós víamos na rua, pessoas do teatro. A novela me marcou bastante. Quando soube da existência do remake, pensei “o certo seria alguém me chamar”. Pedi para o meu próprio ‘cramulhãozinho’ (risos).

Existe a possibilidade de remontarem a peça “A Máquina”?

Nós sonhamos com isso desde que paramos. No meio da pandemia, o Lázaro me mandou uma mensagem, dizendo que tinha lido a peça para os filhos dele. “Foi apoteótico”, ele falou. Daí fiz isso com o Vicente, o meu menor. A Dri (Adriana Esteves, esposa do ator) acompanhou. Nas últimas duas páginas, não consegui ler, tamanho embargo na minha voz. Daí falei com o Wagner e ele fez a mesma coisa. Tive um insight e perguntei: ‘Por que não montamos em 2025?” Nós fizemos a peça em 2000 e o personagem viaja 25 anos para frente. A ideia não era remontar, mas adaptar para uma versão em 2025. Nós temos um grupo de WhatsApp e começamos a sonhar com isso. O João disse que nem seria necessário reescrever porque é o Antônio de 2025 que está narrando a peça. Mas tem uma questão de agenda. Wagner mora em outro país e tem trabalhado bastante. O Lazinho é uma das pessoas mais ocupadas deste país. Ficou difícil essa ideia, mas temos isso no ar. Surgiu a possibilidade de fazermos um podcast da peça e estamos pensando sobre isso. Pode ser que saia.

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