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A dança de Débora Duboc

Por Bravo
Atualizado em 21 set 2022, 22h18 - Publicado em 6 dez 2019, 09h38

Atuando sozinha e imóvel em “A Valsa de Lili”, a atriz inspira a vida e seu ofício ao retratar a história de Eliana Zagui, que vive numa UTI há 40 anos

Foto: João Caldas

Por Gabriela Mellão

Como se faz justiça ao milagre da existência? O que é de fato viver? Como alguém que vive preso a uma cama pode ser mais pulsante do que tantos outros com todas as possibilidades do corpo? Eliana Zagui habita uma UTI há quase 40 anos. Uma poliomielite mal diagnosticada lhe roubou praticamente todos os movimentos do corpo aos 2 anos de idade. Eliana teve que aprender o que é a vida limitada a uma cama. De lá ela se dedicou aos mistérios do existir. De lá se tornou inspiração. Tocado por sua história, escrita por ela própria por meio de sua boca no livro Pulmão de Aço, Aimar Labaki compõe a dramaturgia de A Valsa de Lili, solo dirigido por Débora Dubois.

Imóvel do pescoço para baixo, Débora Duboc permanece presa a uma cama/lápide durante todo o espetáculo. Em oposição à mortalidade do corpo, seus olhos e boca pulsam vitalidade e dançam, celebrando a vida a cada respiração. Bailam pelas memórias de Eliana, rodopiam através do presente conquistado diariamente valsando por dores e amores enquanto desbravam a rotina asséptica ao lado de sua verdadeira família, companheiros de quarto, médicos e enfermeiros.

A atriz vive plena seu ofício apoiada apenas nas modulações de voz, na expressividade do rosto e nos movimentos do pescoço, produzindo faísca de vida a partir de parcos recursos, como a própria Eliana. Revela à plateia a beleza intangível dos bailes desta travessia ao mesmo tempo tão estranha e familiar, uma vez que a personagem atravessa vivências próprias a qualquer pessoa, apesar de sua condição física singular, como a necessidade de afeto, a luta para se manter pulsante e para seguir apesar dos pesares, a busca por sentido.

A dança de Duboc/Eliane comove pela ânsia de viver. Vinda de uma existência restringida de alguém a quem foi tudo tirado, com exceção da vocação para a vida, é um sopro de vitalidade lançado diretamente na alma do espectador. Um exemplo de vida com o poder de fazer remexer até mesmo a apatia do homem contemporâneo.

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A Valsa de Lili. Giostri Teatro e Livraria (Rua Rui Barbosa, 201), às quintas e sextas-feiras, às 21h; R$ 50; até 13/12.

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