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Dia da Mulher Negra e de Tereza de Benguela: uma jornada de luta e conquistas

No centro das reivindicações está o conceito de "bem-viver"; Entenda como surgiu a data e quais são as conquistas e lutas vigentes

Por Beatriz Magalhães
Atualizado em 25 jul 2024, 13h26 - Publicado em 25 jul 2024, 10h08
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 (Enginakyurt / Pexels/fotografia)
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O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, celebrado anualmente em 25 de julho, serve como um farol de luta e resistência contra as desigualdades raciais e de gênero que permeiam a sociedade. Mais do que uma data comemorativa, este dia é um convite à reflexão sobre a trajetória histórica das mulheres negras na região e as reivindicações das quais ainda precisam ser implementadas para alcançar a plena equidade.

Esta data não apenas celebra a luta e conquistas das mulheres negras em toda a América Latina e Caribe, mas também homenageia uma das figuras mais importantes da resistência negra e indígena no Brasil colonial: Tereza de Benguela.

Quem Foi Tereza de Benguela?

Tereza de Benguela viveu no século XVIII e se tornou uma figura central na resistência contra a escravidão no Brasil. Líder de um quilombo localizado na região onde hoje é o estado de Mato Grosso, Tereza liderou uma comunidade de negros e indígenas que resistiu bravamente à opressão colonial por quase duas décadas, após a morte de seu marido, o líder do quilombo, José Piolho.

Sob sua liderança, o Quilombo do Quariterê tornou-se um exemplo de organização e autossuficiência, desenvolvendo um sistema de governança próprio, com conselhos deliberativos e práticas democráticas. Além de garantir a liberdade de seu povo, Tereza também estabeleceu alianças estratégicas e defendeu seu quilombo de diversas incursões dos colonizadores.

Segundo a obra Enciclopédia negra: Biografias afro-brasileiras, de Flávio dos Santos Gomes, Jaime Lauriano e Lilia Moritz Schwarcz, em meados do século XVIII – mais exatamente em 1748 – já há registros do quilombo do Quariterê. “Ele foi crescendo, de tamanho e em população, e formou mais de um núcleo, atraindo as expedições punitivas das autoridades coloniais. Visto como ameaça, era atacado, mas ressurgia. Em 1770, porém, ocorreu uma grande expedição punitiva e o Quariterê foi considerado extinto”.

Ainda de acordo com informações da Enciclopédia, há descrições minuciosas acerca da estrutura e organização do quilombo, que revelariam a figura de Tereza. Nesse quilombo já existira um rei, que havia morrido, e quem então governava era a “Rainha viúva Tereza”. Detalhes sobre tal reinado mencionam um parlamento em que presidia o capitão-mor José Carvalho [ou José Cavalo] e era conselheiro da rainha um José Piolho”. Aliás, tal quilombo seria também chamado de quilombo do Piolho, talvez sugerindo que houvesse mais de um mocambo e diversas estruturas de poder, economia e de proteção militar, todas conectadas.

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Félix_Vallotton, 1911 (Wikipedia commons/domínio público)
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Em outros registros, sem necessariamente mencionar Tereza e seu antigo reinado, o bandeirante Francisco Pedro de Melo disse que o quilombo do Quariterê havia sido “atacado e destruído haverá 25 anos”, porém, muitos povos escravizados resistiram e permaneceram escondidos nas vizinhas.

Assim, os quilombolas remanescentes do Quariteré passaram por uma reinvenção étnica junto a grupos Indígenas do Mato Grosso colonial. Os sobreviventes do reino de Tereza de Benguela eram regentes, padres, médicos, pais e avós do pequeno povo que formava o atual quilombo. No fim do século XVIII, ressurgiria com vigor e originalidade esse quilombo, constituído por uma população de africanos mais velhos e indígenas mais jovens.

Tereza foi uma liderança de destaque pela resistência à escravidão, desafiando não apenas o sistema colonial, mas também as normas de gênero de sua época. Sob seu comando, o Quilombo do Quariterê se tornou um espaço de verdadeira resistência cultural.

Raízes de um movimento: a busca por um espaço próprio

A criação do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha em 1992 se entrelaça com o contexto histórico de ascensão dos movimentos feministas e negros nas décadas de 1970 e 1980. Bianca Santana, jornalista, escritora, professora e Diretora-executiva da Casa Sueli Carneiro, contextualiza: “Havia uma necessidade de um espaço de auto organização. Porque no feminismo, elas tinham que lidar com o racismo das mulheres brancas. E no movimento negro, elas tinham que lidar com o machismo dos homens negros.”

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Quando me descobri negra, livro de Bianca Santana (Editora Fósforo/reprodução)
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Inspirado pelo I Encontro Nacional de Mulheres Negras no Brasil em 1988, o encontro de mulheres negras latino-americanas e caribenhas em Santo Domingo, na República Dominicana, em 1992, marcou a oficialização da data. Desde então, o dia 25 de julho se tornou um símbolo da união e da luta por reconhecimento das mulheres negras em toda a América Latina e Caribe.

O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha não se limita a uma data simbólica. Sua importância reside no impacto que gera nas políticas públicas e no debate social sobre a situação das mulheres negras na região.

Como ressalta Bianca, “a data marca na agenda pública a necessidade de pensar as diferenças e também as especificidades das mulheres negras.” Por meio da visibilidade proporcionada pela data, as desigualdades enfrentadas pelo grupo em áreas como educação, saúde, trabalho e segurança pública ganham destaque, impulsionando a formulação de políticas públicas mais direcionadas e eficazes.

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A autora Bianca Santana (Fernando Rabelo/divulgação)

Nas últimas décadas, a América Latina e o Caribe testemunharam avanços significativos na luta pelos direitos das mulheres negras. A implementação de políticas como as cotas raciais nas universidades brasileiras é um exemplo claro do impacto transformador dessas mobilizações sociais. No entanto, ainda há muitos desafios a serem superados, e a luta está longe de terminar.

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Apesar das conquistas, problemas como feminicídio, violência policial e discriminação racial continuam a impactar gravemente a vida das mulheres negras, exigindo ações firmes e contínuas. De acordo com o Instituto Ethos, apenas 4,7% dos cargos de liderança nas 500 maiores empresas do Brasil são ocupados por pessoas negras, um dado que revela a persistente desigualdade no ambiente corporativo.

Já os dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) mostram que, no primeiro trimestre de 2023, a remuneração média das mulheres negras no Brasil era de R$ 1.948. Isso representa apenas 48% do que ganham os homens brancos, 62% do salário das mulheres brancas e 80% do rendimento dos homens negros.

Além disso, a população negra no Brasil enfrenta dificuldades significativas no acesso à saúde, segundo a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN). Pessoas de cor preta (11,9%) e parda (11,4%) relatam sentir discriminação nos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS). Mulheres negras, em particular, enfrentam maiores taxas de mortalidade materna e violência obstétrica.

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Mulheres segurando faixa com os dizeres “Mulheres Negras: Guerreira Brasileira, MNU – Bahia”, 1989 (Jonatas Conceição / Arquivo Fotográfico Zumvi/reprodução)

Lideranças Inspiradoras: guiando o caminho para a equidade

O movimento de mulheres negras na América Latina e Caribe é composto por diversas lideranças inspiradoras que dedicam suas vidas à luta por justiça e igualdade. Entre elas, destaca-se Sueli Carneiro, referência intelectual e ativista brasileira.

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Outras figuras importantes incluem Lélia Gonzalez, Maria Beatriz Nascimento, Luiza Bairros, Nilma Bentes, Zélia Amador, Mônica de Oliveira, Wanda Menezes, Vânia Santana, Ingrid Faria, Maíra Vida, Ìyá Sandrali, Winnie Bueno, Iêda Leal e Zezé Menezes.

No centro das reivindicações do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha está o conceito de “bem-viver”. Essa proposta vai além da simples busca por melhores condições de vida, defendendo um modelo social que reconheça e valorize a diversidade cultural, a ancestralidade africana e a sustentabilidade ambiental.

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Faixa onde se lê “Mulheres negras- Bahia. Violência pelo bem viver”. 1ª Marcha das mulheres negras contra o racismo e à violência, 2013 (Lázaro Roberto/ Arquivo Fotográfico Zumvi/reprodução)

Como afirma Bianca Santana, “o bem-viver é a principal reivindicação hoje do movimento de mulheres negras.” Essa visão holística da vida se traduz em demandas por políticas públicas que garantam acesso à educação de qualidade, saúde integral, trabalho digno, moradia adequada, segurança pública e participação política efetiva.

O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha é um convite à ação individual e coletiva. É um momento para celebrar as conquistas alcançadas, reconhecer as lutas ainda em curso e fortalecer o compromisso com a construção de uma sociedade mais justa e igualitária para todas as mulheres.

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Honrar a memória das mulheres negras que nos antecederam e unir forças com as lideranças do presente é fundamental para construir um futuro onde o racismo e o sexismo sejam

 

 

 

 

 

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